quarta-feira, 7 de março de 2018

DUSSEL, Enrique. Ética Comunitária. Madrid: Ediciones Paulinas, 1986


 Relatório de Leituras
 Estevão da Silva Barros

 DUSSEL, Enrique. Ética Comunitária. Madrid: Ediciones Paulinas, 1986

Capítulo 1 – Práxis e Reino – Explique o Reino de Deus como “cara a cara” absoluto e sua tensão com a história.

Partindo de definições prévias de amor, práxis e comunhão, Enrique Dussel defende o reino de Deus como o “cara a cara” absoluto, ou seja, o lugar no espaço e no tempo onde as relações práticas que possibilitam o ser humano tornar-se pessoa frente a outro ser humano e agindo ou interagindo em relação a ele. O Reino de Deus é a realização plena deste projeto. Sua tensão com a história se dá na medida que este projeto, o Reino, se dá início na comunidade. É esta situação paradigmática que pode ser notada no livro de Atos. Lá percebe-se esta unidade interpessoal de respeito, justiça, gozo, amor mútuo e amizade. “São sinais do milagre de ser comuidade”. Eles buscavam o Reino de Deus e a sua justiça (Mateus 6.33). Mas, o Reino de Deus mantém, em si mesmo, a tensão do “ainda não”. Ele não depende totalmente de realização humana. Ainda há algo que fica por fazer. É o caráter utópico do projeto de Deus. É uma meta histórica futura, ou na linguagem bíblica, o aspecto escatológico.

Capítulo 2 – Maldade e Morte – O que seria a terceira morte falada por Dussel?

Todo o ser humano conhece a morte física da qual ninguém pode escapar. Há uma segunda morte, trata-se da morte espiritual como fruto da opção pelo pecado (Romanos 5.12). Entretanto Dussel fala de um terceiro tipo de morte. É a morte causada por quem tira o sustento e não paga o “pão” ou o justo salário, desta forma derramando sangue (Eclesiastes 34.22). Sistemicamente, o dominador tira o produto do trabalho de seu próximo e com isso o mata, tirando-lhe a vida. Ao mesmo tempo, este pecador é condenado à morte eterna por seu pecado, pois vive sua vida através da morte e espoliação de seu próximo. Para que esta cadeia seja quebrada é necessário que o ser humano tenha consciência de seu lugar de atuação e papel na sociedade em que nasce. Ele deve ter consciência das estruturas institucionais produtoras de comportamento e ideologias. Não há como fugir a esta responsabilidade. Conscientemente se conhece, se goza e se afirma no poder. Da mesma forma, conscientemente se conhece a humilhação e a debilidade. Desta forma, dia a dia se assume um papel de mudança ou manutenção desta sociedade.

Capítulo 3 – Moral social vigente: O “princípio Babilônia” – Relacione moral e ética.

Moral (Ethos com “E” maiúsculo) é o conjunto de regras que procuram perpetuar um projeto histórico qualquer. Tudo o que afirma este determinado projeto é moral ao passo que tudo o que se lhe opõe é imoral (contra este projeto). Por isso  moral é relativa e nem sempre é boa ou positiva, pois tudo dependerá a que projeto ela se refere e busca perpetuar. Ética (ethos com “e” minúsculo) refere-se, no original grego, à casa ou moradia das pessoas. Com o passar do tempo esta palavra passou a ser empregada no sentido mais amplo visando à possibilidade de convivência justa e pacífica entre todos os seres humanos. Daí entende-se que o Reino de Deus é o projeto ético que visa a justiça e a paz a todos indistintamente. Enquanto a moral pode ser plural, pois várias ordens vigentes existem, e já existiram ao decorrer da história, a ética é singular, pois o ideal é um só, a boa convivência entre os seres humanos. Nem tudo o que é moral é ético e, ao mesmo tempo, nem tudo que é imoral é antiético. Isso é notado no exemplo de Jesus. Ele foi entregue aos romanos como um malfeitor e alguém contrário à ordem vigente. Ele não seguiu a moral vigente. 

Capítulo 4 – Bondade e Vida – Como se herda o bem na comunidade?

O mal está há muito tempo presente e inserida na realidade dos seres humanos. A possibilidade do mal ser percebida é muito grande. O mal está tão presente que podemos afirmar que é uma manifestação inerente nas relações sociais e humanas. Podemos percebê-la todos os dias. Em todos os lugares, nas mais diversas formas de manifestação. A comunidade se contrapõe ao sistema do mal, quando sua práxis se origina da Palavra e da presença de Deus na forma viver e lidar com seu próximo. O bem também está presente onde o ser humano está através da conexão com Deus.
Deus com e no meio de seu povo e o povo com e junto com Deus é capaz de estabelecer uma nova relação de confiança e de despertamento para a vida através de uma aliança comum na defesa da vida e da dignidade humana. Os crentes vivem com sua confiança nas promessas e nos ensinos dados por Deus. O ser humano sem a presença de Deus tenderá sempre para o mal. Por esta razão a comunidade deve basear sua força de ser, agir e viver em conformidade aos princípios e a práxis de Deus em relação com seu povo. Agentes multiplicadores da graça e do amor de Deus.

Capítulo 5 – Ética Comunitária: o “Princípio Jerusalém” – Como se distingue a moral da ética?

   O pobre é vitima de uma fabricada pobreza. Pobreza causada pelo mal, pelo pecado, pela opressão e ganância dos mais fortes, daqueles – que sendo a minoria da população - exploram os muitos, oprimindo-os violentamente, nem sempre fisicamente, mas na dignidade, na fome, no frio uma forte exclusão social. Este pobre quando vê no outro, um igual, ser humano digno de respeito, sujeito como ele digno de viver plenamente a vida, possuidor dos mesmos direitos. Este pobre que se liberta da ordem moral, tornar-se livre e participante do reino de Deus. Contrário daquele que sem consciência da opressão se deixa dominar pela moral impostora, elaborada a serviço da opressão e da dominação dos ricos. A evangelização tem um papel fundamental, anunciadora de libertação levando-os a serem benditos aos olhos de Deus. Não que isto seja uma obrigatoriedade, mas é um meio em auxiliar o outro com a Palavra de Deus a tomar consciência de uma situação e continuar uma busca de libertar o outro, tão necessitado quanto aquele.

Capítulo 6 – Sensibilidade, Justiça e Sacramentalidade – Explicar a relação entre sacramentalidade e sensibilidade.

Dussel coloca a sensibilidade como à capacidade do conhecimento como meio de obter o significado do ser, em sentir a necessidade e expressões do ser humano diante do desafio da fome, do frio e de outros sentimentos que traduzem a satisfação diante de situações de contentamento. Dussel coloca que esta sensibilidade é capaz de projetar sobre o ser humano uma consciência de atos exteriores. A partir dela é capaz de se proteger diante dos exteriores. Já a sacramentalidade, visto como um sinal da graça demonstra através da materialidade seu significado.  A materialidade da sacramentalidade conecta e nos desafia despertar nossa sensibilidade diante dos atos de graça e misericórdia. Capazes de nos tocar, em nossos íntimos. A sacramentalidade une, junta um ao outro, quebra o paradigma de uma religiosidade individual e os envia a viver todas as relações humanas, físicas e espiritual no afã de uma justiça baseada na ética cristã.

 Capítulo 7 – Legalidade Moral e Ilegalidade ética – Como você explicaria a diferença entre Lei e Fé?
     
Na concepção paulina, o regime da Lei (moral) está ligado à ordem do pecado e da morte, enquanto que a fé está relacionada ao espírito novo e a ordem da vida. Para ele, a lei não é capaz de conduzir à vida, ao contrário disso, ela gera um perpétuo estado de desespero no ser humano. A lei não é capaz de absolver, mas sim, tem caráter absolutamente condenatório. Por isso a lei não pode justificar, senão somente tornar a humanidade ré. Num ambiente em que se semeia a lei, tão somente, propicia medo e desesperança. Não que a lei não seja boa ou necessária, porém quando despojada de outros elementos – como a fé aqui em questão – só encaminha para a morte. Já a fé traz o espírito da vida. Em outras palavras, a fé viabiliza a esperança e a libertação. Ela atua como agente de absolvição, por isso mesmo produz sentimento de liberdade diante dos imperativos da lei. Em suma, a lei pertence à ordem moral. Portanto, oriunda da carne. Entretanto, a fé é inerente a ordem ética e nos envia ao reino de Deus.

Capítulo 8 – Relações de produtores e práxis do povo – Como distinguir a práxis de libertação do povo de outras práxis do povo?

Primeiramente precisamos observar que a práxis de libertação do povo não tem o seu ponto de partida no próprio povo. Não surge, por assim dizer de indivíduos, nem de elites, nem de intelectuais, mas sai do lombo de uma geração de profetas e, sobretudo de uma multidão de vidas que vive sob o domínio de outras tantas. Nasce, portanto da teologia popular. Em seguida, a grande marca que essa práxis possui é da luta contra as estruturas de pecado estabelecidas. Não se trata, por conseguinte, de uma filosofia ou ideologia que gera entusiasmo, como vários modelos de práxis do povo e, que não resultam em atitudes mas ficam tão somente na esfera do discurso. Ao contrário disso, a práxis de libertação encaminha do protesto para a atitude. Com isso, automaticamente chegamos ao terceiro diferencial. Ou seja, há um rompimento com os modelos pré-estabelecidos que são geradores de opressão aos mais frágeis, principalmente do primeiro para o terceiro mundo. Enfim, a práxis de libertação do povo têm origem no povo, se desenvolve com o povo e, por fim gera a autonomia do povo dentro de uma nova ordem histórica.

 Capítulo 9 – Heroicidade política e martírio eclesial – Como podemos estabelecer uma ponte entre o herói e o profeta?

Primeiramente, precisamos mencionar que é perfeitamente possível se estabelecer uma ligação entre o herói e o profeta, muito embora existam distinções claras entre um e outro. Na realidade é imprescindível dizer que para fazer uma ponte entre profeta e herói, antes de mais nada, é necessário saber a condição em que se encontram ambos. Para ser mais claro, determinar se o Estado é ou, não, laico pode ser profundamente preponderante nessa questão. Isso porque num território em que “Religião e Estado” são inseparáveis, o profeta – como na história de Israel – que denuncia o rei em favor do órfão e da viúva por vezes se torna herói, outras vezes um mártir. Mas nesse caso, o campo de atuação se entrelaça. Já na nossa realidade brasileira, por exemplo, temos mais facilidade em relacionar o profeta ao herói, uma vez que o Estado aqui é laico. Por esse motivo, a trilha percorrida por ambos, são tangenciais. Ou seja, tanto o profeta quanto o herói levantam suas vozes para libertar vidas. Organizam-se para essa tarefa e acabam por cooptar outras pessoas que trabalharão com ele até que os objetivos sejam efetuados. Resumindo, o profeta e o herói possuem pontos de convergência claros na luta pela libertação dos subjugados. Talvez seja essa a ponte entre ambos.

Capítulo 10 – Morais relativas e ética absoluta – O que significa a transcendentalidade crítica da ética?

Significa em primeiro lugar que há uma clara distinção do papel da ética e da moral. A moral é relativa e necessária para a construção das relações sociais. Não é possível existência de ética sem a moral que a “coloque em prática”. Entretanto a moral pode ser absolutizada por grupos dominantes transformando-a em ética e sistemas absolutos para o ser humano. A ética, por sua vez, tem um valor absoluto e transcendental. Ela não pode ser relativizada, pois isso seria um perigo à existência humano e ao projeto maior de Deus para a humanidade. Ela é transcendental porque ultrapassa os limites do tempo e do especo sendo útil e viável a todos os grupos e comunidades humanas (diferentemente da moral). Por isso a ética assume um papel crítico (como um policial) junto à moral criticando-a e questionando-a todo o tempo.

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