quarta-feira, 7 de março de 2018

FUNDAMENTOS TEOLÓGICOS DA ÉTICA PASTORAL


Notas de aula para diálogo – Prof. Ronaldo Sathler-Rosa.

A Cristologia e a mensagem do Reino de Deus: matriz da ética pastoral 

A Cristologia é a matriz primária da ética teológica. A reflexão sobre as práticas de Jesus e, especialmente, Sua proclamação do “evangelho do reino de Deus” (Lucas 8.1) oferecem os parâmetros para o agir das comunidades e pessoas cristãs. O reino é expressão da graça de Deus. A Ética do Reino é a ética da nova criação; do novo coração e espírito; da nova aliança; do novo povo; de koinonia (Junges, 2001, p. 89ss). A ética teológico-pastoral é a contrapartida humana que assume forma de perspectivas, atitudes, ações, práticas em resposta à graça. A ética cristã é, portanto, sinal de compromisso humano. A ética, então, rege-se pela gratuidade e não por moralismos ou legalismos.

Portanto, o agir humano com motivação e intenção cristológica é resultante da ação graciosa de Deus que antecede e fundamenta as ações humanas. A estrutura literária de Romanos (Bíblia Sagrada) situa, teologicamente, a ética: até o cap. 11 descreve os atos salvíficos de Deus, através da manifestação de Sua graça em Jesus Cristo; o capítulo 12, até o 16, versa sobre a praxis. Trata-se, agora, de exortar, com base nas “misericórdias de Deus, que apresenteis o vosso corpo por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus que é o vosso culto racional. E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos ...” (Romanos 12.1-2; Cf. Efésios 4.1). É a vez da práxis, ou da prática refletida resultante das generosas ações de Deus para salvar o povo. A práxis é ação com intenção transformadora; ou a práxis é “a maneira atual de estar em nosso mundo frente ao outro” (Dussel, 1987, p. 18).

Considerações sobre concepções de ética 

1. Acompanhamos L. Boff (2003):

Etimologia do termo remonta-se ao grego ethos (com e minúsculo, morada, abrigo permanente); ethos, com E maiúsculo (costumes) (p. 29);

A “morada” enraíza os humanos; dá-lhes segurança e permite-lhes  sentir-se bem no mundo. É obra da cultura; tem que ser construída pelos humanos. O ethos é, portanto, processual, aberto, sempre se refazendo (p. 28).

“Ética tem a ver com fins fundamentais (como poder morar bem) com valores imprescindíveis (como defender a vida, especialmente a do indefeso), com princípios fundadores de ações (dar de comer a quem tem fome) etc” (p. 28).

O centro de ethos  é o bem (Platão), felicidade (Aristóteles), definido como “aquele estado de autonomia vivido no nível pessoal e no nível social” ou a auto-realização pessoal e social (p.29).

“Esse fim, a autonomia, realiza-se por intermédio de mediações, tais como hábitos, virtudes e estatutos jurídicos, que são os caminhos concretos de auto-realização pessoal e societária” (p. 29).

“Esses meios também eram chamados de ethos”, traduzido também por moral/morais, pois a moral é condicionada histórica e culturalmente. Os conceitos de moral e ética freqüentemente se superpõem (p. 29).

2. Conforme Jung e Silva (1995):

A ética é também a teoria sobre a prática moral. É a “reflexão teórica que analisa e critica ou legitima os fundamentos e princípios que regem um determinado sistema” (p. 13).

Procura responder à pergunta: que devo fazer?

“O ser humano deve, portanto, construir ou conquistar o seu ser. Ele não nasce pronto, se faz ser humano, se torna pessoa. O grande desafio de nossas vidas é este processo de construção de nosso ser” (p. 15).

A visão ética reflete também um sonho: quando se pergunta “o que devo fazer” ou sobre o “que deveria ser” pressupõe-se diferença entre o “ser” e o “dever ser”. Busca-se o novo!

“Só quando superamos a visão da realidade existente como algo inquestionável e absoluto é que podemos imaginar, sonhar e pensar sobre uma outra realidade diferente e melhor” (p. 16).

A experiência ética fundamental é a descoberta da diferença entre o que é e o que deveria ser (p. 14).

3. De acordo com Junges (2001):

A ética tem a ver com dilemas, desafios, impasses “no âmbito das vivências e no nível da sistematização teórica” (p. 13).

A modernidade, como processo civilizatório, é a matriz cultural do agir humano, do exercício da ética, de seu modo de viver e de pensar a ética.

Dilema ético-pastoral: “Como seres embebidos da cultura individualista podem indignar-se eticamente?” (p. 24).

A modernidade, enquanto etapa histórica, aponta a emergência do sujeito autônomo que se posiciona ativamente no mundo e o transforma segundo seus interesses. Move-o uma construção moral e mental.

A denominada pós-modernidade assume e exacerba dois princípios fundamentais da modernidade: individualismo, do indivíduo autônomo ao indivíduo narcísico/hedonista; racionalidade, da racionalidade instrumental à racionalidade fragmentada. Não tem telos. A fragmentação baseia-se no “declínio da verdade, do sujeito e do ser” (p. 21). Declina a verdade metafísica e “objetiva”; a verdade é interpretação, relativismo. É o tempo da anomia.

A exigência da universalidade é colocada em xeque o que gera uma crise ética. 

Ética pastoral

Ética pastoral consiste na reflexão sobre o agir do pastor e da pastora. É o estudo do caráter moral do exercício do ministério e dos respectivos deveres e direitos inerentes ao ministério (Cf. Gula).

Um conceito de ética profissional: “Obrigações de natureza moral que orientam a prática de grupos vocacionais e seus membros ao tornarem disponíveis ao público seus conhecimentos especializados e suas competências” (G. R. Dunstan, apud Campbell, 1987, p. 83); inclui deveres profissionais estabelecidos por suas instituições ou profissões.

Que elementos definem a constituição de uma profissão?
           
1.      Tem corpo de conhecimento e definição de competências;
2.      Possui autonomia frente às leis, condicionada à observância de sua disciplina;
3.      Reconhece código corporativo de conduta (Código de ética?);
4.      Tem direito à satisfação social e à recompensa material (Dunstan, 83)

 Referências bibliográficas

A BIBLIA SAGRADA. Revista e atualizada no Brasil. 2a. ed. São Paulo: SBB, 1993

BOFF, Leonardo. Ethos mundial. Um consenso mínimo entre os humanos. Rio de Janeiro: Sextante, 2003

DUNSTAN, G.R. Ethics, professional. In: CAMPBELL, Alastair V. (Ed.). A dictionary of pastoral care. New York: Crossroad, 1987

DUSSEL, Enrique.  Ética comunitária. Petrópolis: Vozes, 1987

GULA, Richard M. Ética no ministério pastoral. São Paulo: Loyola, 2001

JUNGES, José Roque. Evento Cristo e ação humana. Temas fundamentais de ética teológica. São Leopoldo: Editora Unisinos, 2001

SUNG, Jung Mo e SILVA, Josué Cândido da. Conversando sobre ética na sociedade. Petrópolis: Vozes, 1995

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