Notas de aula para diálogo – Prof. Ronaldo
Sathler-Rosa.
A Cristologia e a mensagem do Reino de Deus: matriz da ética pastoral
A Cristologia é a matriz primária
da ética teológica. A reflexão sobre as práticas de Jesus e, especialmente, Sua
proclamação do “evangelho do reino de Deus” (Lucas 8.1) oferecem os parâmetros
para o agir das comunidades e pessoas cristãs. O reino é expressão da graça de
Deus. A Ética do Reino é a ética da nova criação; do novo coração e
espírito; da nova aliança; do novo povo; de koinonia
(Junges, 2001, p. 89ss). A ética teológico-pastoral é a contrapartida humana
que assume forma de perspectivas, atitudes, ações, práticas em resposta à
graça. A ética cristã é, portanto, sinal de compromisso humano. A ética, então,
rege-se pela gratuidade e não por moralismos ou legalismos.
Portanto, o agir humano com
motivação e intenção cristológica é resultante da ação graciosa de Deus que
antecede e fundamenta as ações humanas. A estrutura literária de Romanos (Bíblia
Sagrada) situa, teologicamente, a ética: até o cap. 11 descreve os atos
salvíficos de Deus, através da manifestação de Sua graça em Jesus Cristo; o
capítulo 12, até o 16, versa sobre a praxis.
Trata-se, agora, de exortar, com base nas “misericórdias de Deus, que
apresenteis o vosso corpo por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus que é o
vosso culto racional. E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos
...” (Romanos 12.1-2; Cf. Efésios 4.1). É a vez da práxis, ou da prática
refletida resultante das generosas ações de Deus para salvar o povo. A práxis
é ação com intenção transformadora; ou a práxis
é “a maneira atual de estar em nosso mundo frente ao outro” (Dussel, 1987, p.
18).
Considerações sobre concepções de ética
1. Acompanhamos L. Boff (2003):
Etimologia do termo remonta-se ao
grego ethos (com e minúsculo, morada, abrigo permanente); ethos,
com E maiúsculo (costumes) (p. 29);
A “morada” enraíza os humanos;
dá-lhes segurança e permite-lhes
sentir-se bem no mundo. É obra da cultura; tem que ser construída pelos
humanos. O ethos é, portanto, processual, aberto, sempre se refazendo
(p. 28).
“Ética tem a ver com fins
fundamentais (como poder morar bem) com valores imprescindíveis (como defender
a vida, especialmente a do indefeso), com princípios fundadores de ações (dar
de comer a quem tem fome) etc” (p. 28).
O centro de ethos é o bem (Platão), felicidade (Aristóteles),
definido como “aquele estado de autonomia vivido no nível pessoal e no nível
social” ou a auto-realização pessoal e social (p.29).
“Esse fim, a autonomia,
realiza-se por intermédio de mediações, tais como hábitos, virtudes e estatutos
jurídicos, que são os caminhos concretos de auto-realização pessoal e
societária” (p. 29).
“Esses meios também eram chamados
de ethos”, traduzido também por moral/morais, pois a moral é
condicionada histórica e culturalmente. Os conceitos de moral e ética
freqüentemente se superpõem (p. 29).
2. Conforme Jung e Silva (1995):
A ética é também a teoria sobre a
prática moral. É a “reflexão teórica que analisa e critica ou legitima os
fundamentos e princípios que regem um determinado sistema” (p. 13).
Procura responder à pergunta: que
devo fazer?
“O ser humano deve, portanto,
construir ou conquistar o seu ser. Ele não nasce pronto, se faz ser humano, se
torna pessoa. O grande desafio de nossas vidas é este processo de construção de
nosso ser” (p. 15).
A visão ética reflete também um
sonho: quando se pergunta “o que devo fazer” ou sobre o “que deveria
ser” pressupõe-se diferença entre o “ser” e o “dever ser”. Busca-se o novo!
“Só quando superamos a visão da
realidade existente como algo inquestionável e absoluto é que podemos imaginar,
sonhar e pensar sobre uma outra realidade diferente e melhor” (p. 16).
A experiência ética fundamental é
a descoberta da diferença entre o que é e o que deveria ser (p.
14).
3. De acordo com Junges (2001):
A ética tem a ver com dilemas,
desafios, impasses “no âmbito das vivências e no nível da sistematização
teórica” (p. 13).
A modernidade, como processo
civilizatório, é a matriz cultural do agir humano, do exercício da ética, de
seu modo de viver e de pensar a ética.
Dilema ético-pastoral: “Como
seres embebidos da cultura individualista podem indignar-se eticamente?” (p.
24).
A modernidade, enquanto etapa
histórica, aponta a emergência do sujeito autônomo que se posiciona ativamente
no mundo e o transforma segundo seus interesses. Move-o uma construção moral e
mental.
A denominada pós-modernidade
assume e exacerba dois princípios fundamentais da modernidade: individualismo,
do indivíduo autônomo ao indivíduo narcísico/hedonista; racionalidade, da
racionalidade instrumental à racionalidade fragmentada. Não tem telos. A
fragmentação baseia-se no “declínio da verdade, do sujeito e do ser” (p. 21).
Declina a verdade metafísica e “objetiva”; a verdade é interpretação,
relativismo. É o tempo da anomia.
A exigência da universalidade é
colocada em xeque o que gera uma crise ética.
Ética pastoral
Ética pastoral
consiste na reflexão sobre o agir do pastor e da pastora. É o estudo do caráter
moral do exercício do ministério e dos respectivos deveres e direitos inerentes
ao ministério (Cf. Gula).
Um conceito de ética
profissional: “Obrigações de natureza moral que orientam a prática de grupos
vocacionais e seus membros ao tornarem disponíveis ao público seus
conhecimentos especializados e suas competências” (G. R. Dunstan, apud Campbell, 1987, p. 83); inclui
deveres profissionais estabelecidos por suas instituições ou profissões.
Que elementos definem a
constituição de uma profissão?
1.
Tem corpo de conhecimento e definição de competências;
2.
Possui autonomia frente às leis, condicionada à
observância de sua disciplina;
3.
Reconhece código corporativo de conduta (Código de
ética?);
4.
Tem direito à satisfação social e à recompensa material
(Dunstan, 83)
A BIBLIA SAGRADA. Revista e
atualizada no Brasil. 2a. ed. São Paulo: SBB, 1993
BOFF, Leonardo. Ethos mundial.
Um consenso mínimo entre os humanos. Rio de Janeiro: Sextante, 2003
DUNSTAN, G.R. Ethics, professional. In:
CAMPBELL, Alastair V. (Ed.). A
dictionary of pastoral care. New York: Crossroad, 1987
DUSSEL, Enrique. Ética comunitária. Petrópolis: Vozes,
1987
GULA, Richard M. Ética no
ministério pastoral. São Paulo: Loyola, 2001
JUNGES, José Roque. Evento
Cristo e ação humana. Temas fundamentais de ética teológica. São Leopoldo:
Editora Unisinos, 2001
SUNG, Jung Mo e SILVA, Josué
Cândido da. Conversando sobre ética na sociedade. Petrópolis: Vozes,
1995
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Deixe seu comentário, importante saber sua impressão sobre os textos, com issto podemos dialogar.